A formação profissional e o mercado de trabalho
Dilceu Sperafico
Apesar de avanços e demandas da tecnologia e inovação, em todos os segmentos sociais, culturais e econômicos do País, os trabalhadores com ensino superior são os que mais demoram a retornar ao mercado de trabalho, mesmo insistindo na busca de nova vaga, o que nos parece contraditório ou conflitante.
Conforme levantamento da Consultoria iDados, divulgado neste ano, antes do novo coronavírus, os profissionais que cursaram faculdade demoravam, em média, 16,8 meses para conseguir nova colocação, enquanto trabalhadores com ensino médio aguardavam 14,7 meses e os que cursaram apenas o ensino fundamental esperavam, 13,1 meses para retornar ao mercado de trabalho.
Os números constam de informações do 3º trimestre de 2019, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, e conforme especialistas, diversos fatores explicam as razões para os trabalhadores melhor escolarizados demorarem mais para conquistar novo emprego, quando se fala tanto na importância do aprendizado e da especialização.
Conforme especialistas, brasileiros com ensino superior costumam trabalhar apenas em regime formal e como tal, em caso de demissão, recebem indenização, como multa do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), e seguro-desemprego, com o que conseguem ter alguma folga maior no orçamento pessoal para buscar a recolocação.
Além disso, segundo pesquisadores, pelo lado das empresas, a contratação de trabalhador mais qualificado também costuma ser mais lenta, por ser avaliada com mais critérios. Na prática, essa questão não é conjuntural, pois é da natureza das ocupações que exigem maior formação, incluindo o ensino superior.
Nesses casos, os processos de seleção são mais criteriosos, pois a disponibilidade de vagas específicas é menor e esse diferencial não deve ser atrelado à conjuntura da economia nacional e mundial na época, até porque a taxa de desemprego desse público é sempre menor do que a de outros grupos de pessoas menos escolarizadas.
Outro fato importante que não pode ser ignorado, é a preferência das empresas por profissionais que muitas vezes já estão empregados, com qualificação comprovada, o que contribui para aumentar a espera por novas vagas de trabalhadores com ensino superior, mesmo estando fora do mercado.
Pelas projeções de especialistas, a taxa média de desocupação deveria ficar na média de 11,4% em 2020, pois se previa a geração de 800 mil vagas formais no ano, o que significava dois milhões de postos abertos desde 2017, mas isso pode mudar muito com a pandemia de Covid-19.
A volta da criação de emprego formal também não iria compensar tudo o que foi perdido durante a crise dos anos de 2015 e 2016, somando três milhões de vagas fechadas. Sendo assim, por mais que o mercado melhorasse, as pessoas ainda iriam ter dificuldades para encontrar novo emprego, mesmo sem pandemia de Covid-19.
A previsão era que os mais qualificados continuassem demorando um pouco mais para conseguir novo emprego dentro de prazo razoável, mas não se pode esquecer que o desemprego havia recuado puxado pela informalidade recorde dos últimos anos.
Ocorre que empresas passaram por processo de consolidação de direção na última crise e devem enxugar ainda mais suas estruturas no curto prazo. Além disso, muitas funções sêniores se concentraram e acabaram absorvendo também áreas similares e as empresas modernas não voltarão a ter estruturas inchadas.
Dilceu Sperafico é ex-deputado federal e ex-chefe da Casa Civil do Governo do Paraná - dilceu.joao@uol.com.br