A máscara da vergonha
J. J. Duran
Os números das estatísticas oficiais sobre a população pobre são uma espécie de autoconfissão de culpa não só dos governantes, mas de cada cidadão.
Neles constata-se uma realidade indignante, que convida todos a olharem de frente o drama daqueles que nada têm além de um fio de esperança por dias melhores.
A gravidade da situação, mais visível na indo América que no resto do mundo, obriga-nos a refletir por que uma sociedade cristã, civilizada e pseudo fraterna chegou a essa desumana situação de convívio.
A dimensão da pobreza vai bem além da visão compassiva que temos do desamparo daqueles irmãos que vivem e dormem nas ruas, ou daquela criança que mendiga com sua mãe para poder sobreviver nesse oceano de amarguras que contrasta com a imundície político-social comum à maioria dos países.
Essas pesquisas são um instrumento de expiação em que os falsos profetas da ressurreição da igualdade social se espelham para se converter em implacáveis acusadores e atribuir a culpa aos outros, jamais a si próprios.
Estatísticas como essas são a máscara de uma vergonha ocultada por trás da promessa do novo tempo, do futuro paradisíaco pós-reformas liberais ou das migalhas fraudulentas entregues pelos governos pseudo progressistas.
Pouco importa a metodologia arquitetada desde os refrigerados gabinetes oficiais e oficiosos de muitas das organizações qualificadas como beneméritas para retratar, consternadas, o submundo que compartilhamos alegremente.
Devemos mergulhar nesse submundo para compreender a magnitude do verdadeiro drama por trás das benesses paliativas outorgadas como esmolas, pois as falsas sociedades beneficentes não sabem o que é necessidade.
Esse submundo de miséria e frustração é fruto do discurso falacioso e das políticas ancoradas no sacrifício cada vez maior dos necessitados, resultado do fracasso da política social de Estados ausentes, discriminantes e mentirosos contumazes, independente da bandeira desfraldada no palanque eleitoral.
Existe um claro preconceito associado ao silêncio de culpa pelas causas que por dezenas de décadas prometeram modificar esse cenário, mas só ficaram na promessa.
Os que culpam os pobres por sua condição de pobreza são os mesmos que ocultam, despudoradamente, os malefícios dos benefícios de que gozam de forma despudorada.
Frente à afronta que significam os crescentes números frios das estatísticas sobre esse cenário de miséria, todos carregamos uma pedra no sapato chamada culpa.
J. J. Duran é jornalista e membro da Academia Cascavelense de Letras