A velhíssima política
Editorial Estadão
É certo que o "novo" não é, necessariamente, sinônimo de "bom" na política. Pode ser, ao contrário, um retrocesso - um flerte com soluções autoritárias, que prescindem do Congresso por considerar a atividade política insalubre por princípio. O País deve, portanto, resistir ao discurso segundo o qual basta expulsar do poder todos os que se identificam com a "velha" política para que os problemas se resolvam. Contudo, há uma velhíssima política que, esta sim, precisa ser eliminada urgentemente do cenário nacional. Trata-se de parlamentares que exploram a política como instrumento para a satisfação de seus interesses privados e, assim, não se importam em promover o atraso no País se isso facilitar a manutenção de seus currais eleitorais.
É o caso, por exemplo, do presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). Embora seja do mesmo partido do presidente da República, Michel Temer, o senador Eunício tem sido um opositor de fazer inveja a muitos petistas. Agora mesmo, no auge da complexa crise que resultou na alta dos combustíveis e, por conseguinte, no protesto de caminhoneiros que paralisou parte do País, o presidente do Senado partiu para a simplificação rasteira, típica dos palanques. Em entrevista ao Estado, referindo-se à política de preços da Petrobrás sob a gestão de Pedro Parente - que respeita a oscilação dos preços internacionais do petróleo e, portanto, dispensa os subsídios que tanto prejuízo deram à estatal durante o governo petista -, o senador Eunício saiu-se com esta: "Entre os ?Parentes? e os consumidores, eu fico com os consumidores".
Na mesma entrevista, o presidente do Senado tratou de forma igualmente ligeira outro assunto delicado, a privatização das falidas distribuidoras da Eletrobrás no Norte e no Nordeste, passo necessário para a privatização da própria Eletrobrás. Questionado se apoiava a decisão da Câmara de não votar a medida provisória que destravaria o leilão das distribuidoras, anunciada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Eunício declarou: "Já temos o aumento do combustível e agora vamos aprovar outra medida provisória preparativa para o aumento de energia? Pelo amor de Deus! Energia, gasolina, gás de cozinha. As pessoas estão com medo de voltar ao fogão a lenha e ainda serem penalizadas pelo Ibama".
Tal reação nem para comício deveria prestar. A Eletrobrás e suas distribuidoras estão quebradas, em razão da política suicida para o setor de energia levada adiante pelo governo de Dilma Rousseff, e os consumidores já estão pagando a conta dessa irresponsabilidade. Caso a privatização continue a ser sabotada, o prejuízo será ainda maior. Só para constar, a perda do País com a transformação da Eletrobrás em laboratório da incúria petista já custou, no total, R$ 228 bilhões.
O senador Eunício coroou sua entrevista confirmando sua indisposição de retomar a discussão da reforma da Previdência ainda neste ano, como pretende o presidente Temer. Nada surpreendente para quem já declarou que não admitia a reforma porque, em suas palavras, não aceitava "mexer na aposentadoria dos mais pobres" - uma das tantas mistificações produzidas pelas corporações interessadas na manutenção da Previdência tal como está.
Compreende-se o comportamento do presidente do Senado quando se observa que entre seus principais aliados está o ex-presidente Lula da Silva, preso por corrupção e líder da sabotagem ao atual governo. Como Lula ainda é muito popular no Nordeste, políticos como Eunício não pensam duas vezes antes de abraçar a demagogia lulopetista, muito mais vantajosa, do ponto de vista eleitoral, do que a desgastante defesa das reformas. Eunício é, também, aliado da oligarquia Gomes.
E Eunício não está sozinho. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, também não perde oportunidade para se distanciar da agenda reformista do atual governo. Apesar de relativamente novo, o deputado Maia tem encarnado igualmente essa anacrônica política movida a indiferença com o interesse público, que tão mal tem feito ao País. E ambos, Maia e Eunício, estão no comando do Congresso. Poucas situações retratam melhor o atraso brasileiro.