Agro brasileiro padece da falta de política estratégica
A última estratégia concreta e completa que a agricultura brasileira teve data ainda de 1974 e foi comandada por Alysson Paulinelli, então ministro da Agricultura do Governo Geisel. Foi naquela época que se criou a Embrapa e a Emater, órgãos que muito contribuíram para o desenvolvimento do agronegócio.
"Mas depois disso tivemos apenas soluços positivos, entremeados por problemas sérios de comunicação, como é o caso mais recente de desmatamentos e queimadas na Amazônia, que ameaçam nossos mercados", alertou o agrônomo e ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues em palestra aos 350 participantes do Brasil Pork Event, realizado em Foz do Iguaçu.
Ele conhece o tema como poucos, pois foi em 2004, durante o Governo Lula e quando ele era ministro, que o Brasil alcançou o pico maior de desmatamento, que atingiu 27,8 mil quilômetros quadrados. "Como reflexo das medidas adotadas a partir de então, os índices foram reduzidos nos anos seguintes e ainda permanecem muito inferiores."Não é verdade que desmatamos mais que nunca. Os números do Inpe mostram que de 2004 até agora, o Brasil diminuiu 72%. Cresceu nos últimos dois anos, por falha do Governo Dilma, mas estamos praticamente na média dos últimos 20 anos", disse.
O acordo internacional sobre o clima, do qual o Brasil é signatário, estabelece como meta até 2020 a redução do desmatamento em 80% dos índices de 2004. Hoje estamos em 72%, não muito distantes. Outro compromisso era o de reduzir as emissões de CO2 em 1,24 gigatoneladas. Segundo Rodrigues, apenas a redução do desmatamento na Amazônia e no cerrado, já mitigou estas emissões em nada menos que 2,28 gigatoneladas, quase o dobro da meta.
Segundo Roberto Rodrigues, outro problema está na confusão que se faz entre desmatamento e queimadas. "São duas coisas que têm dinâmicas diferentes. Desmatamento ilegal e um crime, praticado por invasores, tarefeiros, posseiros. Já a queimada de pasto é uma técnica ancestral, mais velha que andar para frente. O agricultor, desde seus antepassados, costumava colocar fogo no pasto velho, para nascer pasto mais verde e dar uma limpada no intestino do gado", esclareceu.
CONCORRÊNCIA INTERNACIONAL
Roberto Rodrigues garantiu em sua palestra que a origem de toda a recente polêmica em relação à Amazônia está no interesse comercial e na forma atabalhoada com que reagimos. Segundo ele, o estopim acendeu com o avanço do acordo Mercosul-União Europeia, que vinha sendo negociado há mais de 20 anos.
Cerca de 40% do comércio mundial de alimentos acontece sob o guarda-chuvas de acordos, similares ao Europa-Mercosul. Sem depender das regras e amarras da Organização Mundial do Comércio, eles reduzem tarifas, baixam custos para o consumidor e interessam especialmente aos governos europeus, que deixariam de gastar subsidiando fortemente a agricultura local. Sua população teria acesso a alimentos mais baratos e os governos deixariam de investir fortunas em subsídios aos seus produtores.
O problema é que ao amarrar a negociação, ninguém combinou com os agricultores europeus, que obviamente se sentem ameaçados pelo agro brasileiro. "O produtor europeu não aceita a concorrência brasileira e nós demos argumentos para eles, ao começar a falar sobre Amazônia. Nós fomos estúpidos e gente do governo também foi estúpida, ao criar uma polêmica desnecessária. Estamos na média de desmatamentos dos últimos 20 anos, mas a informação que acabou se sobressaindo foi a de que nós estamos queimando tudo", detalhou.
Outro aspecto, segundo ele, igualmente ignorado pela imprensa é que a matriz energética brasileira é composta em 43% por fontes renováveis, enquanto a mundial é de apenas 14%. Inverdades também são amplamente divulgadas em relação ao uso de defensivos agrícolas, lembrou Roberto Rodrigues. Ao contrário do que se diz, o Brasil é um dos países que menos consome agrotóxicos.
Segundo pesquisa divulgada pela Unesp-Botucatu e FGV, o maior consumidor de defensivos do mundo é o Japão (aplica o equivalente a 95,4 dólares de agrotóxicos para produzir uma tonelada de alimento), seguido da Coréia (47 dólares), Itália (22 dólares), França (18,4 dólares por tonelada), Canadá (17,8 dólares), Reino Unido (15,1), Espanha (14,6), Estados Unidos (11,3 dólares), Austrália (9,3 dólares), Polônia (8,8 dólares). Só após estes países é que desponta o Brasil, com o uso de 8,1 dólar em defensivos, para produzir uma tonelada de alimentos. (Foto: Divulgação)