Estados atolados em gastos
Editorial Estadão
Como um grande sumidouro, os gastos com pessoal e Previdência engolem a cada ano uma parcela maior da receita dos governos estaduais, tornando mais difícil a prestação de serviços e aumentando o risco de insolvência. Dezesseis Estados mais o Distrito Federal já perderam a garantia da União para tomar empréstimos. Outros seis Estados, incluído São Paulo, estão arriscados a entrar para esse grupo já no próximo ano, advertiu a Secretaria do Tesouro Nacional. Basta uma olhada nesses tenebrosos dados financeiros para confirmar a necessidade urgente da reforma previdenciária em todos os níveis de governo.
A solução mais simples, mais veloz e mais eficiente será a inclusão de Estados e municípios na reforma já em discussão no Congresso. O caminho mais prático, nesta altura, deve ser mesmo o encaminhamento, a partir do Senado, de uma proposta paralela de emenda constitucional, mas para isso os governadores ainda relutantes terão de abandonar seu comodismo político.
A piora da situação financeira de Estados e Municípios foi confirmada para todo o País com a publicação, pelo Tesouro Nacional, do Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais. Os entes são classificados em quatro categorias de acordo com sua capacidade de pagamento. Só um Estado tem nota A: o Espírito Santo, assunto de reportagem do semanário britânico The Economist por sua competente administração fiscal. Nove têm nota B, incluído São Paulo. As categorias C e D reúnem as unidades sem condições de receber garantia da União para tomar empréstimos. De 2017 para 2018 o número de unidades nos dois níveis inferiores passou de 15% para 17,63% do conjunto formado por Estados e DF.
Só três Estados, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, têm nota D. As péssimas condições financeiras dos três são notórias há vários anos. O caso do Rio de Janeiro se destaca, no entanto, como exemplo incomum dos vínculos entre corrupção, desmandos administrativos e devastação fiscal, econômica e social. O relatório fica longe dos aspectos mais escabrosos da experiência fluminense, mas boa parte da história já foi registrada nas páginas mais feias da crônica política, da crônica policial e dos autos da Justiça.
O quadro das notas poderá piorar em 2020. Seis Estados - Acre, Pará, Paraíba, Piauí, Paraná e São Paulo - estão perto de romper o limite de 95% na relação entre despesa corrente e receita corrente líquida e poderão passar à categoria C em 2020. Além disso, 14 Estados já gastam com pessoal mais que 60% da receita corrente líquida, teto fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
O cenário já seria muito ruim mesmo sem a falsificação das contas, mas ainda é preciso considerar esse dado: despesas de R$ 11,4 bilhões foram escondidas em 2018 para evitar o descumprimento da LRF e punições para governadores. Sem isso, os governos estaduais teriam terminado o ano com déficit primário de R$ 5,8 bilhões, em vez de registrar superávit de R$ 5,6 bilhões.
Os governos terão de consertar seus problemas fiscais sem ajuda federal, porque a situação das contas públicas impede qualquer renegociação das dívidas estaduais, adiantou o secretário de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues.
Não é, de fato, tempo adequado a mais leniência. Uma das causas do agravamento dos problemas estaduais foi o endividamento autorizado pelo poder central, irresponsavelmente, na fase petista. Houve relaxamento nas contas de todos os níveis de governo.
Tem-se falado, em Brasília, de novo pacto federativo, com nova repartição de recursos entre União, Estados e municípios. Também se tem falado sobre repasse de recursos da cessão onerosa, negociada entre União e Petrobrás, a Estados e municípios. Será imprudência cuidar desses temas sem fixar, muito claramente, condições de responsabilidade para os governos subnacionais e critérios para uso de recursos. Um país com Estados e municípios incapazes de sobreviver sem grandes transferências e sem o socorro frequente da União tem sido e continuará sendo um arremedo de Federação.