O aniversário
J. J. Duran
Ao chegar a data do aniversário, muitos de nós que temos o dom de chegar próximo de um centenário de vida, prêmio Nobel da existência, sentimos um misto de tristeza e solidão.
Lembramos que o aniversário nos tempos idos significava o começo de um novo tempo, bem como da comemoração singela ao lado dos familiares e padrinhos para compartilhar um bolo caseiro.
Nessa passagem invernal, fomos crescendo e pedindo a Deus que nos desse um sentido de vida em nosso caminhar.
Hoje, longe daqueles tempos, já na ausência de muitos rostos familiares e sem a ritualidade de antanho, nos resta somente agradecer pela longa vida e por estarmos cercados de filhos e netos, símbolos de uma pureza que desaparece com a chegada da infância.
Já aos 90 anos e longe, muito longe do passado dissidente e cliente habituê das masmorras do autoritarismo e das "carícias"daqueles primatas que destroçavam corpos, reflito que algo não vai bem no pequeno mundo que compartilho com os últimos amigos desta vida, porém que são os primeiros a estarem junto ao caixão quando de minha partida.
Já não escrevo mais com palavras de protesto para corrigir falhas históricas na indo América, do tempo anterior à compreensão de que essas causas deram passagem a um efeito que se chama injustiça estrutural em diferentes repúblicas.
Tenho contas pendentes com os idos anos de 1960, por isso peço perdão a todos aqueles que acreditaram em meus apelos errôneos pelo enfrentamento armado contra o poder dominante.
Nesta minha velhice de exilado aprendi a olhar de forma profunda o pensamento alheio, ouvir o que me dizem e não o que quero ouvir, respeitar a crítica e reconhecer que os erros que vi nos outros também são meus erros.
Estes últimos aniversários são um aviso do solstício invernal avisando que me aproximo da hora de me perpetuar na foto amarelada, na charla recordatória das festas familiares e na releitura de alguma página cheia de mediocridade escrita por mim.
J. J. Duran é jornalista e membro da Academia Cascavelense de Letras