Desastre, o destaque do Brasil
Editorial Estadão
Com 13,2 milhões de desempregados, ou 12,5% da população ativa, o Brasil se destaca na cena mundial pelo enorme custo social de uma recessão iniciada há quatro anos, mal superada e ainda presente, como assombração, no dia a dia da maior parte das famílias. Filas de pessoas em busca de uma vaga, comuns no dia a dia das cidades brasileiras, são um dos símbolos mais dramáticos de uma crise ainda sem perspectiva de rápida solução. São também, além disso, uma das diferenças mais impressionantes entre a situação do País e a dos países emergentes e desenvolvidos. A economia global tem perdido impulso, mas, ainda assim, o desemprego brasileiro é maior que o de quase todos os países-membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Nesse conjunto, formado por 36 associados, o desemprego médio em abril ficou em 5,2% da força de trabalho, menos de metade da taxa nacional registrada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Em março e abril, só três desses países tiveram desemprego maior que o do Brasil. Não por acaso, são três das economias mais atingidas pela crise financeira iniciada em 2007-2008 e por gravíssimos problemas fiscais. Na Grécia, havia 18,1% de desocupados em março, pelos últimos dados da OCDE. Na Turquia, ainda em março, 13,6%. Na Espanha, em abril, 13,8%. Em 23 países do grupo, os últimos dados indicaram desocupação inferior a 6%. Alguns exemplos: Estados Unidos (3,6%), Holanda (3,3%), Israel (3,8%), México (3,5%), Alemanha (3,2%), Coreia (4,1%) e Canadá (5,7%), entre outros.
O contraste é igualmente forte quando se consideram números absolutos. Em toda a OCDE havia 33,3 milhões de desempregados segundo o levantamento de abril. Os desocupados do Brasil, 13,2 milhões, eram bem mais que um terço daquele total. Em toda a zona do euro, onde se encontram algumas das maiores porcentagens de desemprego da OCDE, os desocupados eram 12,5 milhões segundo o último levantamento - cerca de 700 mil a menos que no Brasil.
Não se disfarça o problema lembrando a grande população do Brasil, estimada em cerca de 209 milhões de habitantes. Nos 19 países onde se usa o euro, a última estimativa aponta 339,2 milhões. Nos Estados Unidos, onde estão desempregados 5,8 milhões de trabalhadores, vivem mais de 328 milhões de pessoas.
O desastre social do desemprego é a parte mais feia da prolongada crise brasileira - um detalhe aparentemente menosprezado pelos atuais condutores da política econômica. O quadro poderia ser menos grave, se a recuperação iniciada em 2017, depois de dois anos de recessão, se houvesse firmado e acelerado. Mas essa expectativa foi desmentida pelos fatos. Há dois anos o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,1%. Essa taxa foi repetida em 2018, porque os negócios perderam impulso depois de um primeiro trimestre promissor. A crise do transporte rodoviário, em maio, seus efeitos e a incerteza política frearam a atividade na segunda metade do ano.
Chegou-se a prever um melhor desempenho neste ano, depois da posse do novo governo, mas essa aposta foi errada. A insegurança persistiu, em boa parte sustentada pelos tropeços políticos do Executivo, pela ação confusa de ministros e pela omissão do presidente da República em relação às questões mais urgentes e aos principais projetos de sua equipe. Tudo se passou como se a agenda dessa equipe e a de seu chefe fossem totalmente distintas.
A economia brasileira encolheu 0,2% no primeiro trimestre e o País se distanciou ainda mais do resto do mundo. Em abril, o Fundo Monetário Internacional reviu de 3,5% para 3,3% sua projeção de crescimento global em 2019; para o Brasil, foi cortada de 2,5% para 2,1%, mas até esse número parece uma fantasia. No País, as expectativas já estão em torno de 1%. Como ficarão os desempregados e subempregados, se o governo deixar qualquer estímulo para depois de aprovada a reforma da Previdência? Mais do que cifras, a questão envolve as condições de sobrevivência de dezenas de milhões de pessoas. Isso faz diferença?