Mercado leiteiro ganha mais força e transparência
A cadeia produtiva brasileira de leite, principalmente a partir dos anos 90, passou a enfrentar transformações provocadas pela desregulamentação do setor. Neste cenário, crises surgiram no mercado de leite, devido aos baixos preços pagos aos produtores, o que desencadeou uma série de conflitos entre os setores produtivo e industrial no início dos anos 2000. Após uma sequência de protestos e greves, em 2001, foi instaurada uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Leite na Assembleia Legislativa do Paraná e em outros Estados brasileiros, para investigar as causas da crise.
Com o andamento da CPI, verificou-se a necessidade de estabelecer um referencial de preços para o leite. Essa era a brecha para a mobilização do setor, com representantes que pudessem auxiliar na organização, desenvolvimento e na busca por soluções conjuntas. Tal demanda manifestou-se durante reuniões da Comissão Técnica de Bovinocultura de Leite da Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná). Nesse momento, ficou ainda mais claro que as relações conflituosas entre os setores produtivo e industrial precisavam de uma resolução que ambos os lados fossem atendidos, com transparência e responsabilidade.
Então, em 2002, foi criado o Conselho Paritário de Produtores/Indústrias de Leite do Estado do Paraná, conhecido como Conseleite, reunindo representantes dos produtores e de indústrias de laticínios do Estado, em equivalência na quantidade de membros. Participam do Conseleite a Faep, o Sindileite (Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Estado do Paraná) e a UFPR (Universidade Federal do Paraná), responsável pelo levantamento das informações de mercado de laticínios.
O Conseleite-PR calcula e determina preços de referência para o leite como matéria-prima a partir dos preços médios de 14 produtos e derivados comercializados pelas indústrias. A metodologia de análise considera parâmetros de qualidade e volume do leite entregue às indústrias, com base nos custos de produção nas propriedades, e os preços dos produtos lácteos, com o custo de produção das indústrias. Dessa forma, também é definida a participação percentual do produtor e da indústria em um produto.
CONFIANÇA MÚTUA
O preço de referência é um instrumento que possibilita a livre negociação comercial entre os produtores de leite e a indústria de laticínios. De acordo com o presidente do Conseleite e da Comissão Técnica de Bovinocultura de Leite da Faep, Ronei Volpi, tal medida proporciona maior transparência para o mercado lácteo e o desenvolvimento harmônico da cadeia.
?A divisão é proporcional ao mercado. A indústria e o produtor andam no mesmo sentido, ou dividindo ganhos ou dividindo perdas. É destinado um valor que dá respaldo ao produtor, resolvendo aquela situação de possibilidade de exploração, com preços pagos extremamente baixos?, explica.
Para chegar na definição deste preço, o Departamento de Economia Rural e Extensão da UFPR realiza o levantamento de uma série de informações referentes ao desempenho comercial dos produtos lácteos no atacado. Os valores do Conseleite são gerados a partir da média ponderada dos produtos comercializados pelas indústrias paranaenses participantes. Todos os dados catalogados pela UFPR são sigilosos, sem acesso pelos membros do Conselho, de modo que o cálculo seja feito com o máximo rigor e idoneidade. A partir da metodologia aplicada, com alguns critérios a serem considerados, esses dados são utilizados no cálculo do preço final de referência.
A cooperação das indústrias é um dos pontos chaves para o bom funcionamento do Conseleite. Para isso, foi necessário realizar um forte trabalho para estabelecer a confiança de ambos os lados, produtor e indústria, com a garantia de que a transparência seria o mote do processo."Nesse período de convencimento, foi muito importante a participação do Sindicato das Indústrias, de seus dirigentes, em convencer as indústrias a sentar e discutir com os produtores, olho no olho. Afinal, nós tínhamos que buscar uma forma de ser transparente uns com os outros?, ressalta Volpi.
O princípio da transparência resolve as relações conflituosas que predominavam no setor, pois, com o preço praticado pelas indústrias em mãos, os produtores conseguem compreender o motivo da oscilação de preços da matéria-prima, principalmente quando atingem baixos valores. Quando o processo de negociação corre sem complicações, garante-se um abastecimento mais estável de matéria-prima à indústria.