Como o uso excessivo do celular afeta a saúde
Maurício Marteleto
Doenças causadas pelo uso de aparelhos eletrônicos não é algo que cause surpresa na comunidade médica. Foi assim com o rádio e a televisão no passado e com os microcomputadores nas décadas de 80 e 90, por exemplo.
O vilão da vez é o celular: são bilhões de aparelhos utilizados diariamente nos últimos 10 anos. Já é possível enumerar uma série de condições patológicas as quais podemos atribuir quase que exclusivamente ao excesso do uso da tecnologia.
Do ponto de vista puramente ortopédico, é possível antever uma série de problemas, que vão desde hérnias de disco causadas por má postura, até as não menos graves tendinites nos punhos, mãos e compressões de nervos periféricos.
A tendinite é fácil de entender. Muito esforço ou tempo prolongado de uso do smartphone, postura ruim, cifótica, cabeça e tronco fletidos podem estar associados a alterações dos plexos e vias do sistema nervoso autônomo (aquele que age de forma independente da vontade do indivíduo e governa funções vitais como batimento cardíaco, tônus vascular, suor, funções viscerais, secreção de alguns hormônios, vontade de urinar, evacuar etc.)
O esforço repetitivo gerado pelo uso excessivo do celular expõe células e tecidos, que normalmente estariam "escondidos" da ação do sistema imunológico, promovendo inflamação. Isso acontece ou por um defeito/imaturidade do sistema imune, que acaba por produzir anticorpos contra o próprio organismo no caso das doenças autoimunes, ou por lesão mecânica das delicadas estruturas neurotendíneas.
Em alguns casos, a inflamação e o inchaço nos punhos e mãos poderá causar compressão de nervos de maior calibre, promovendo a síndrome do túnel do carpo (STC), que pode causar a perda de sensibilidade dos dedos.
À medida que avançamos no conhecimento das doenças provocadas pelo uso do smartphone, entendemos que o mecanismo que causa a doença é muitas vezes semelhante, cumulativo e suas consequências podem ser graves. Felizmente para muitos, as alterações funcionais provocadas por essas dependências comportamentais podem, se tratadas corretamente no início, ser resolvidas por intermédio da cinesioterapia (terapia com movimentos para reabilitar áreas comprometidas do corpo) ou por procedimentos e medicamentos apropriados.
O problema é quando a pessoa só percebe a situação como mais ou menos grave tardiamente. Por isso, o ideal é prevenir a doença com medidas simples, como restringir o tempo de uso do aparelho. Falar até meia hora por dia é considerado seguro, mas já há trabalhos mostrando que o uso de celulares por mais de 30 minutos/dia aumenta a chance de desenvolvimento de alguns tipos de gliomas, que são tumores do sistema nervoso central.
Se isso já não fosse complicado o suficiente, existe o problema das lesões por esforços repetitivos, microfissuras nos tendões por excesso de esforço, que provocam inflamação e dor nas articulações, além do problema da radiação emitida pelo aparelho, que deve ficar a pelo menos 20 cm do corpo em situação de repouso?stand by?
Manter as rédeas e impor limites a si mesmo é uma estratégia que se torna complicada à medida que o uso de celular e smartphones se torna imprescindível até para saber se as crianças estão prontas e aguardando no ponto para o transporte escolar, se levaram o lanche pra escola, entre outros lembretes - mas é fundamental.
A substituição de atividades sedentárias por atividades físicas pode ser uma boa estratégia de sucesso para isso. E, no caso das crianças, considero essencial explicar a elas o que o uso excessivo de smartphones pode causar. A partir daí, deixe que elas mesmas mudem suas rotinas, que interajam melhor presencialmente e adotem as tecnologias modernas somente para situações específicas. Portanto, pondere o seguinte: se há inúmeras razões para usar o celular, há também inúmeras razões para moderar seu uso.
Maurício Marteleto é médico ortopedista