Desejar não é realizar
J. J. Duran
É difícil para o ser humano sentir que não é corespondido em seus sentimentos, ou seja, confiar em alguém e ser traído. Também é difícil reatar um vínculo que já perdeu a sua essência.
Em conversa com um respeitável e cultíssimo amigo sobre a política e os políticos, ouvi dele o versículo 8:7 do profeta Oseias, que ao testemunhar a dor de Deus, disse: "Pois eles semearam o vento, e ceifarão o redemoinho".
Buscava este colega jornalista uma forma sincera, profunda e inteligente para explicar, despojado de interesses revanchistas, o que pensa um aderente do populismo após tomar conhecimento das tantas falcatruas cometidas pelos atores políticos dos últimos anos. Vi nele uma grande frustração pelo fato de ter sido usado como parte democrática de uma gestão governamental que traiu ideais e princípios morais.
Na América Latina, mesmo com novos governos democraticamente eleitos, os irmãos brasileiros e argentinos ainda vivem na zona cinza do descrédito deixado pela classe política que governou os dois países em tempos recentes. Lulismo e peronismo deixaram a terra arrasada no campo econômico.
Fica claro que o ex-capitão Jair Bolsonaro, antigo habitante do baixo clero parlamentar, e o empresário liberal Maurício Macri são os governantes do pós-populismo, que junto com suas equipes econômicas procuram desesperadamente encontrar o caminho para conduzir os dois países de volta nos trilhos.
No meio desses projetistas do novo tempo ficam dois povos que, apesar de falarem diferentes idiomas, têm uma grande comunhão de sonhos e objetivos.
Bolsonaro surge como um novo farol a iluminar velhos e um tanto desarraigados costumes conservadores, pois sempre se manifestou disposto a implantar programas de ajuste econômico sugeridos pelos "chicago boys" e sua ânsia de privatização das empresas estatais deficitárias. Mas hoje seu pensamento e seu desejo não são realizáveis.
No campo da Previdência, o novo presidente brasileiro já deixou claro que deseja uma reforma menos robusta, mas mais humana e de acordo com seus pensamentos pentecostais, aproveitando-se do fato de, como Macri, ter sido eleito com amplo apoio popular.
Próximo de ter que enfrentar novamente o peronismo neste ano de 2019, o presidente argentino deve estar rezando para que a sombra redentora do seu colega brasileiro o proteja nas urnas. Mas desejos, é importante dizer, nem sempre se realizam.
J. J. Duran é jornalista e membro da Academia Cascavelense de Letras