O perfil do eleitorado brasileiro
Jairo Nicolau
Existem duas formas de tentar responder à pergunta que dá título a esse artigo. A primeira delas é: utilize os dados demográficos (Censo e Pnad) dos adultos. Como o registro de eleitores é compulsório partir dos 18 anos, a expectativa é que não haja grande diferenças entre o perfil do eleitorado e o da população adulta. Mas a comparação tem que ser feita com cuidado, já que dois grupos provavelmente estão subestimados no eleitorado: os analfabetos e os cidadãos com mais de 70 anos.
Desde 1985, quando os analfabetos conquistaram, pela primeira vez na República, o direito de votar, a legislação definiu que o registro e o voto são facultativos para eles. Não sabemos precisamente qual e o volume de analfabetos que estão registrados para votar, nem quantos efetivamente comparecem às urnas. Mas é razoável esperar que uma parte dos analfabetos não se inscrevem. De acordo com Censo de 2010, havia 9.6% entre os eleitores com mais de 15 anos. No mesmo ano, o total de analfabetos entre os eleitores era de 5.9 %.[1] Dados de 2012, mostram que os analfabetos também foram menos às urnas do que outros segmentos: cerca de 63% dos analfabetos compareceram para votar, enquanto nas outras faixas de escolaridade o comparecimento esteve na faixa de 85%.[2]
O fato de o voto ser facultativo para os eleitores com mais de 70 anos não deveria afetar o perfil do eleitorado, já que eles já estão inscritos desde jovens. Mas existe uma regra da Justiça Eleitoral que contribui para que os idosos sejam retirados do cadastro de eleitores. A regra estabelece que se um eleitor não comparecer para votar (e nem justificar sua ausência) em três eleições sucessivas ele é retirado do cadastro. Com a opção do voto facultativo, muitos eleitores com mais de 70 anos não vão votar e, consequentemente, acabam perdendo o título. Dados de 2012 mostram que a abstenção entre os eleitores dessa faixa de idade realmente é muito mais alta: apenas 48% dos eleitores de 70 ou mais anos compareceram.
Uma segunda resposta à pergunta sobre o perfil do eleitorado seria: olhe os dados disponibilizados pela Justiça Eleitoral. No site do TSE é possível obter informações sobre o sexo, a idade e a escolaridade dos eleitores. Foi o que eu fiz para produzir a figuras abaixo.
A Figura 1 mostra o total de eleitores (dados de junho de 2018), segmentados por sexo e idade. O maior contingente de eleitores está na faixa entre 25 e 59 anos. Mas o que chama mais atenção na figura é a dominância das mulheres. Elas são 52% dos inscritos para votar em 2018. Apenas entre os jovens de 16 e 17 anos observamos um equilíbrio entre os dois sexos, nos demais, o predomínio feminino é claro.
Os dados do TSE sobre o grau de instrução dos eleitores, porém, devem ser vistos com muito cuidado. A razão é muito simples. A idade que consta do cadastro é a declarada quando o eleitor tira o seu título pela primeira vez: aos 16, 17 ou 18 anos. Um jovem que está no ensino médio, por exemplo, e tira o título de eleitor será contabilizado como pertencendo à categoria de ensino médio incompleto. [3] Assim, os eleitores com curso superior acabam subestimados no cadastro eleitoral. Novamente, vale uma comparação com os dados de 2010; segundo o Censo havia 7.9% de adultos com curso superior; entre os eleitores o total era de 3.8%.
De qualquer modo, vale a pena observar a distribuição do eleitorado brasileiro por escolaridade segundo os dados do TSE. A Figura 2 mostra o eleitorado inscrito para as eleições de 2018 (dados de junho de 2018), segmentados por grau de instrução e sexo. Chama a atenção a alta concentração de eleitores na faixa do ensino fundamental incompleto (para os dois sexos), e na faixa do ensino médio completo (para as mulheres).
Pelas razões apresentadas brevemente nesse texto ainda não temos como conhecer os detalhes do perfil do eleitorado brasileiro. Em um aspecto (o sexo), sabemos que existe uma grande semelhança entre a distribuição dos eleitores e da população adulta. Os dados indicam ainda que os segmentos para os quais o voto não é obrigatório (analfabetos e eleitores idosos) provavelmente estão sub-representados no eleitorado. Dito de outra maneira: o eleitorado é mais jovem e mais escolarizado do que a população adulta.
Jairo Nicolau é cientista político e professor universitário