O capitão e o establishment
J. J. Duran
Hoje em dia a política não representa mais os cidadãos, mas sim os seus medos e desejos mais irracionais, e o universo político é varrido por uma onda neofascista, que é a expressão visceral das frustrações sociais.
O lacunar verbal, com construção histriônica ou desconstrução feita pelo orador, representa a catarse da frustração popular em torno de um projeto mal interpretado.
Mas distante está Jair Messias Bolsonaro de ser o grande responsável pela destruição do chamado establishment do poder patrimonialista brasileiro, que o transformou em único e fiel expoente de todo um pensamento e de todos os objetivos desse importantíssimo segmento da sociedade brasileira.
As divergências entre o capitão e a elite do atraso se radicalizaram a partir da forma do clã familiar bolsonarista interpretar seu papel na cartilha a ele imposta para ser seguida ao longo do mandato.
Nesse vácuo, o cauto e bem estruturado ministro Paulo Guedes, glorioso banqueiro e ilustre financista, deu mostras de que é possível por em prática um programa de contenção e administração dos bens públicos, bastando para tanto ter inteligência.
No entanto, a irrupção do evangelismo dos pastores dos milagres televisivos e templos majestosos, não calculada pela elite, produziu um vácuo cada vez mais visível entre o núcleo familiar do antigo governo e seu entorno militarizado.
Diante disso a elite patrimonialista brasileira, herdeira de respeitadíssima linhagem familiar, dificilmente voltará a criar, apoiar e sustentar num cenário político conturbado um candidato atormentado e desconectado do que é definido por ela como "a verdade verdadeira".
O neoliberalismo bolsonarista pagou um alto preço por substituir o projeto do establishment patrimonialista pelo intento evangelizador e militarista de combater hipotéticas ameaças comunistas brotadas de sinistras confabulações internacionais, dentro de um enredo digno de historinha infantil.
Resultado: como bem disse Mark Twein, "a história não se repetiu, mas rimou". (Tânia Rego/AGBR)
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário do Paraná