O ex-presidente Bolsonaro e seu mundo paralelo
J. J. Duran
Sobre os escombros do Império Otomano ao final da Primeira Guerra Mundial, Ataturk criou a República Turca, na qual os militares situavam-se acima dos poderes do Estado de Direito. Modelo similar tentou implantar Jair Bolsonaro, que formou seu gabinete com a presença maciça de militares em postos chaves.
Embora escolhido democraticamente pela maioria dos brasileiros em eleições livres, o ex-presidente propôs ao longo de seu agitado mandato justamente o modelo turco. Veladamente, porém de forma constante, apelou a "seu Exército" que interviesse contra outros poderes republicanos.
Uma vez derrotado nas urnas, incentivou seus seguidores a acamparem em frente às unidades do Exército em uma tentativa impensada diante do cenário de altíssima tensão.
Simultaneamente, se fechou em seu mundo paralelo e manteve, mesmo ainda no poder, um silêncio perturbador e que acabou por insuflar ainda mais seus seguidores.
O messianismo bíblico autoritário, conservador e mutilante da livre expressão e do pensamento diverso do seu converteu em uma espécie de seita uma parcela considerável da sociedade brasileira - aliás, e a bem da verdade, é preciso reconhecer que esquerda e direita têm fama como correntes formadoras de grupos ideologicamente fanáticos não só aqui, mas no mundo todo.
Em seu mundo paralelo da realidade, a única lei era sua interpretação caprichosa do limitado poder que tem o titular do poder na democracia e no sistema presidencialista.
Com um Parlamento majoritariamente conservador, patrimonialista e fisiológico, onde hoje estão muitos evangelizados pelos pastores do milagre televisivo, bem que Bolsonaro poderia ressurgir para adotar uma posição de oposicionista, mas com um trabalho construtivo de forma a contribuir para equacionar o difícil quadro do momento nacional, dominado por uma tensão que há muito não se via.
Tomara seus seguidores mais radicais encontrem em algum versículo bíblico a luz da realidade, pois, ao fim de tudo, restou demonstrado que Bolsonaro é um simples mortal como qualquer outro e que Deus é quem está acima de tudo e de todos, inclusive do ex-presidente. (Foto: Reprodução internet)
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário do Paraná