O longo caminho da liberdade
J. J. Duran
Transcorria o ano de 1978 e a Argentina estremecia frente ao confronto estéril e fratricida de seus filhos. A antinomia, a repulsa, a luta entre o governo militar e boa parte da juventude levavam à extrema violência, e por culpa de ambas as partes.
Após ser detido durante uma manifestação política da faculdade de jornalismo, fui levado ao tribunal de Buenos Aires e colocado diante de um juiz altamente respeitado, tanto por militares quanto por opositores do regime, e logo de cara lhe perguntei: "Doutor, como se sentiria se estivesse no meu lugar...?" Embora um artifício retórico, essa pergunta se tornou imperiosa naquele tempo de altíssima tensão sociopolítica.
Essa indagação, sabemos, foi feita desde longínquo tempo por todo dissidente encarcerado por expressar suas ideias e clamar pela liberdade. Levantar a voz dissidente do pensamento único, da verdade inquestionável, lutar via jornalismo pela liberdade oprimida, sempre foram motivos de reação violenta de certas forças macabras encrustadas nos poderes uniformados militarmente. A violência do Estado significa, na sua ideia abstrata, a morte do direito e o silêncio forçoso.
"Emudeceram os pássaros que cantavam liberdades e se escureceu o céu de uma Argentina de joelhos, amordaçada e lastimada": mais ou menos essa foi a motivação do delito de que me acusaram, por ter combatido certos meios fortemente corrompidos pelas benesses do poder.
Era como se eu tivesse dito uma blasfêmia digna de castigo, vociferavam meus críticos neste ano em que a conquista da Copa do Mundo representou a glória para o governo militar.
Os governos revolucionários são rotineiros convites ao tresloucado sentimento do unicato e da obediência devida. Quando isso acontece, a verdade perde valor na boca dos opositores e se converte em dogma religioso na boca dos governantes.
Naquele tempo, lembro-me bem, o poder negava o inegável e castigava com a prisão todos aqueles que tinham elementos que poderiam pôr em dúvida a "verdade" oficial. E a distorção da realidade era alimentada livremente pela imprensa bem remunerada para pavimentar o caminho do ódio e da repressão.
J. F. Kennedy declarou certa vez que "todo autoritarismo violento leva à morte da verdade, da liberdade e daqueles que a reclamam".
Minha presença no tribunal terminou com a absolvição e então parti logo que anoiteceu para Montevidéu. E hoje, com quase 100 anos de idade, ainda estou à procura da resposta do Meretíssimo juiz. (Foto: Reprodução internet)
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário do Paraná