Adversário sim, inimigo não!
J. J. Duran
O atentado sofrido pela vice-presidente da Argentina, o resultado do referendo constitucional realizado no Chile e a tensa campanha eleitoral no Brasil fazem com que a indo-América termine o ano com uma nova cara política-ideológica. Nova cara que poderá ser para melhor ou para pior...
Não há como negar que esse pedaço do continente se consolidou como epicentro dos grandes debates e das grandes lutas políticas e ideológicas deste início de século XXI, em um cenário enriquecido ou embrutecido, segundo a ótica de cada analista, por acontecimentos sociopolíticos que desenharam um novo mapa político para definir o futuro do socialismo humanitário e do neoliberalismo capitalista.
Diferentemente do que muitos costumam afirmar, as ideologias por aqui não estão nas sepulturas, pois sempre revivem nas mentes que interpretam a diferença ideológica do pensamento como terrível afronta à liberdade.
Mentes que resumem seu pensamento político à estupidez de vocábulos que, quanto mais violentos, mais são usados. Escapa a esses pensadores o fato incontestável de que em política devem existir adversários, não inimigos.
Lembro-me ainda hoje do discurso de Ricardo Balbín no adeus a Juan Domingo Perón. "Venho despedir-me do homem que me encarcerou várias vezes, mas também venho me despedir do amigo que me respeitou como adversário político", disse ele, para surpresa de muitos que presenciavam aquele momento.
Fatos como esse nos levam a recordar e reconhecer que a Constituição brasileira resultou do encontro de linhas políticas e ideológicas ferrenhas adversárias no passado, mas que se uniram para redigir uma Carta Magna de altíssimo valor político, social e cultural.
Hoje em dia, porém, tanto aqui quanto lá fora, o recrudescimento do confronto dessas forças é marcado por uma radicalização total delas todas, em um cenário de insensatez humana e altamente propício para a execução de irmãos e não para o debate de ideias.
Não há como exercer a democracia de forma plena sem respeitar o adversário. (Foto: Pixabay)
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário do Paraná