A hora e a vez das cabeças brancas
Renato Sant Ana
"Os oceanos não vão entrar em colapso apenas porque eu joguei o meu lixo na rua", disse ela. E foi além: "Garrafas pet, sacolas plásticas, o lixo da minha cozinha, posso jogar tudo na sarjeta sem me preocupar com o planeta, porque eu, sozinha, não vou abalar o meio ambiente".
Quem seria capaz de pronunciar semelhante disparate e por que o faria? Calma! Foi só uma provocativa ironia para repelir a omissão dos que deixam de votar alegando "ah... o meu voto não vai mudar nada...", que é o mesmo que dizer "ai, o que é que tem que eu seja omisso?".
Era uma professora de filosofia aposentada e tinha 79 anos em 2017, quando, num debate na rádio, se abordava o grande número dos eleitores que deixaram de votar nas eleições municipais de 2016.
E sua advertência segue fazendo cada vez mais sentido. No Brasil e no mundo. Em 2021, no Chile, mais de 50% dos eleitores (basicamente adultos e idosos) deixaram de votar e permitiram que um aventureiro de grêmio estudantil se tornasse presidente do país.
Em janeiro de 2022, portugueses imitaram a patacoada dos chilenos: mais de 50% não votaram. Desse modo, presumíveis adultos e idosos de Portugal permitiram avançar o domínio do socialismo, que combate muitos valores que esses adultos e idosos anseiam por preservar.
No Brasil, cabeças brancas vêm caindo no mesmo erro, omissão que é útil à falange da "revolução cultural", que, para dominar, promove uma "inversão de valores" através da "desconstrução de significados".
Como faz? Manipula sobretudo a juventude, promove a licenciosidade como se fosse liberdade, combate tudo o que seja tradicional, deturpa valores espirituais (o que não tem conotação estritamente religiosa), tudo para fixar as bases de um nefasto Estado totalitário.
A cena é muito comum. Enfiada na poltrona diante da TV, gente de cabelo branco faz caras e bocas assistindo a transgressões de toda ordem (da degeneração dos costumes aos desvios na administração pública), mas não se mexe nem se pergunta o que é que poderia fazer para ajudar a mudar.
Enquanto isso, a juventude que passa por lavagem cerebral na sala de aula vai em frente, fanatizada, obstinada e aferrada a crenças que lhe enfiaram na cabeça mediante manipulação cognitiva e vota a favor de políticas e de políticos que desumanizam o ser humano.
Quanto tempo ainda levaremos para compreender que a omissão é uma forma insidiosa de egoísmo?
Pois que os mais velhos, em especial aqueles dotados da ponderação que a experiência traz , reconheçam o próprio valor, assumam papéis inerentes à maturidade e, seja muito ou seja pouco que esteja a seu alcance, façam a sua parte em favor do futuro do Brasil - votando, inclusive.
É tão fácil compreender que o cuidado de cada um torna a cidade mais limpa. Por que será difícil entender que, de cada um, depende a limpeza moral do país?
Renato Sant Ana é advogado e psicólogo - sentinela.rs@outlook.com