Unioeste formará em maio a 1ª médica com tetraparesia do País
Com colação de grau marcada para maio próximo, quase dez anos após conquistar a tão sonhada vaga no vestibular, Elaine Luzia dos Santos é um exemplo de superação não só para os colegas da Unioeste, mas para estudantes do Brasil e do mundo todo. Assim que receber o diploma, ela se tornará a primeira pessoa com tetraparesia a cursar Medicina no Brasil.
Hoje com 33 anos de idade, Elaine sofreu um AVC durante o curso, que acarretou na perda dos movimentos e da fala, razão pela qual o olhar ganhou significados inéditos e bem maiores para ela, que se comunica com professores, colegas de turma, pacientes, familiares e amigos praticamente apenas com os olhos.
Elaine ingressou em 2012 no curso de Medicina do campus de Cascavel, depois de já formada em Farmácia pela própria Unioeste, e já estava no terceiro ano quando, em novembro de 2014, sofreu um AVC que a levou à tetraparesia. Mas mesmo com todas as dificuldades inerentes à nova situação, ela não perdeu a disposição para ir atrás do seu sonho, enfrentou e se adaptou à nova realidade.
Enquanto ainda estava na UTI, a estudante recebeu a visita de um colega de turma, que lhe apresentou uma ferramenta chamada “prancha alfabética”, que possibilitaria que ela falasse e se expressasse sem nem mesmo utilizar as cordas vocais. A ferramenta consiste em uma tabela, dividida em cinco linhas, cada uma contendo um grupo de letras. Para formar as palavras e frases, Elaine pisca quando a intérprete diz a letra necessária para a construção daquilo que quer comunicar.
O modelo original da ferramenta sofreu algumas alterações para otimizar o seu uso e facilitar a comunicação do cotidiano. Com estas pequenas mudanças no modelo, Elaine dominou e memorizou os grupos de letras em cerca de uma semana e dessa forma passou a se conectar de maneira mais eficaz com as pessoas ao seu redor.
APOIO PEDAGÓGICO
O retorno às atividades acadêmicas, em setembro de 2015, não foi uma tarefa fácil. A Unioeste, por meio do Programa de Educação Especial, acompanhou todo o processo. De acordo com o coordenador do curso de Medicina, o colegiado buscou experiências de outras universidades em situações semelhantes, mas que foi difícil encontrá-las. “Nós fomos atrás de ver essas experiências, mas elas praticamente inexistem, são poucas no mundo com alunos de Medicina. Então, nós mesmos teríamos que ir atrás para resolver a situação”, explica Araujo.
A fim de atender às necessidades apresentadas por Elaine, o curso buscou assessoria jurídica para entender os procedimentos legais e as legislações que deveriam ser cumpridas a fim de formar a estudante, que sempre fez questão de participar de todas as atividades acadêmicas, tanto as de cunho teórico, como prático. Além das estruturas adaptadas, como uma sala especial, os procedimentos de avaliação foram remodelados.
“Existe uma legislação própria para alunos em condições especiais. A Elaine, por exemplo, não tinha condições de fazer um procedimento em um paciente, mas ela possui total capacidade de descrevê-lo. E as avaliações dela sempre foram muito boas, o aproveitamento dela foi muito satisfatório durante toda a graduação”, diz Araujo.
INTERNATO
Para auxiliar a estudante nas aulas online e presenciais, nos atendimentos dentro do Hospital Universitário e nas visitas aos pacientes, a Unioeste disponibilizou docentes de atendimento educacional especializado. Já estiveram com Elaine as pedagogas Vanderlize Simone Dalgalo, Aline Cristina Paro, Graciolinda Santana da Rosa, Silvia Elaine Bertuol, Letícia Nunes Goulart, Marciana Pelin Kliemann e quem acompanha ela hoje são Clarice Fabiano Costa Palavissini e Michele Lopes Leguiça, que está com Elaine há um mês.
Michele, que veio do Rio Grande do Sul especialmente para trabalhar com Elaine, destaca como a força de vontade e a dedicação da estudante fizeram ela ser incluída no ambiente acadêmico, participando de todas as atividades de maneira regular e tendo um bom relacionamento com professores e colegas. “A persistência, a força e a vontade dela fizeram com que ela se comunicasse muito bem. Ela se faz entender, não apenas com os olhos, mas também com o corpo”, explica.
E aos poucos a estudante foi sendo inserida em algumas matérias."Ela não sabia em quanto tempo ia conseguir terminar o curso, mas ela foi realizando uma após a outra e nunca desistiu”, destaca a irmã de Elaine, Elionésia Marta dos Santos. “Hoje a gente olha para ela na reta final do curso e é surreal, como se fosse uma história que estão me contando, tantos altos e baixos, tantas dúvidas que realmente a gente fica mais do que feliz”, completa.
Enquanto exerceu o trabalho de supervisão das atividades de Elaine no HU, a professora Rubia Bethania percebeu que a inclusão da estudante no processo foi natural. “No internato de atendimento dos pacientes a gente trata tudo com muita naturalidade, a Elaine está inserida em um contexto de ensino com muita naturalidade, como as coisas devem acontecer. Ela tem a questão intelectual muito apurada e é muito inteligente, as limitações são apenas de mobilidade, então criamos uma dinâmica para que pudéssemos inseri-la com a maior naturalidade”, explica.
Com base em sua condição, Elaine já escolheu a área em que vai se especializar e que se vê atuando no futuro: radiologia, na produção de laudos médicos. A escolha preza pela independência na hora da atuação profissional. “É uma área na qual eu posso atuar usando todo o meu conhecimento sem depender tanto das pessoas”, diz. (Foto: Divulgação)