Feliz Natal a ‘vocês’
J. J. Duran
Feliz Natal a vocês deserdados sociais, famélicos de justiça, famintos de igualdade e fraternidade, que ouvem nestes dias o tilintar apenas do sino rouco da fome.
Feliz Natal a vocês lavradores, que tiram do ventre generoso da terra o pão que, farto na mesa dos poderosos, falta na casa de seus filhos.
Feliz Natal a vocês operários cinzas, que trabalham entre máquinas ruidosas para produzir a riqueza que os poderosos ostentam e desfrutam.
Feliz Natal a vocês jovens desiludidos ao ver a corrupção e a cobiça daqueles que consomem de forma impiedosa a vossa ilusão redentora.
Feliz Natal a vocês anciãos de cabelos brancos e horizontes negros, que veem a vida passar esquecidos e estendendo as mãos fazedoras de ontem para implorar ajuda hoje.
Feliz Natal a você República cantada em mil vozes, porém maculada pela lama sinistra daqueles que em seu nome roubam, caluniam e destroem a fé do povo que o elegeu para governá-lo.
Feliz Natal a vocês humildes, desconhecidos fazedores da informação, da verdade, do pensamento divergente porém respeitoso, verdadeiros pássaros sonhadores de um céu límpido de mentiras, hipocrisia e mazelas sociais.
Feliz Natal a vocês que têm dois ou mais carros, duas ou mais fazendas e às vezes duas ou mais famílias, sem compreender que jamais poderão viver ao mesmo tempo junto a todas elas.
Feliz Natal a vocês irmãos que, por terem pele negra, ainda sentem a dor causada pela ignorância e pela torpeza do maldito racismo.
Feliz Natal a vocês cinzas, seres sem títulos, sem ontem nem amanhã, vazios de esperança e que caminham pela trilha acidentada da amargura causada pela desilusão e pela solidão.
Feliz Natal a vocês crianças sem lar, sem dignidade e sem pão, que vagam pela imensidão desta terra à procura da "noite feliz” fartamente prometida pelos mercadores da mentira.
Feliz Natal a vocês que, como o menino de Belém, estendem suas mãos em gesto redentor de paz, de amizade e da fraternidade perdida.
Feliz Natal a vocês que se negam a envelhecer e se adaptam respeitosamente às novas situações geradas no bojo do novo misticismo e seguem vendo nos evangelhos do Bom Judeu as verdadeiras faces da justiça.
Neste artigo escolhi gritar aquilo que outros calaram, pois de amor e sonhos muitos já escreveram. Trato o grito de meu corpo ferido pelas mãos do verdugo. Não é culpa minha se não trago flores.
J. J. Duran é jornalista, membro da Academia Cascavelense de Letras e Cidadão Honorário do Paraná