Esqueletos fósseis
Míriam Leitão
A conta de R$ 17 bilhões que a Petrobras foi condenada a pagar a 51 mil funcionários ativos e aposentados é mais um esqueleto deixado pela gestão petista. A quantia é uma enormidade. Para se ter a ideia, toda a receita estimada pelo estado do Espírito Santo este ano é de R$ 16,8 bilhões. É equivalente a 23 vezes o Orçamento do Ministério da Cultura, antes dos cortes impostos pelo governo.
O acordo foi feito pela Petrobras quando ela era presidida por José Sérgio Gabrielli e tinha um sindicalista na diretoria de Recursos Humanos. Foi considerado muito generoso na época e os dois lados comemoraram os resultados da Remuneração Mínima de Nível e Regime. Os jornais dos sindicatos explicaram como se calculava o piso e era exatamente como a empresa estava executando. E ao contrário do que foi dito por alguns ministros do TST, não trata o trabalhador em área de risco da mesma forma que o do escritório. Há diferenças de pisos. O acordo coletivo foi confirmado em 2009 e só virou um problema três anos depois de assinado, quando os sindicatos perceberam que o texto continha brechas que permitiriam outro entendimento. E, obviamente, passaram a requerer mais. Esse é o papel dos representantes sindicais.
A empresa deveria ter analisado o problema, redigido um bom acordo, feito o balanço dos riscos de maneira mais acurada ao longo dos últimos anos. O comitê que decide sobre provisionamento inclui as áreas jurídica, contábil e de conformidades e riscos. Esse comitê avaliou que não era provável que a empresa perdesse a ação. Era apenas "possível". Assim recomendou que a estatal não fizesse a provisão. E ela deveria ter feito, tanto que perdeu a ação no TST.
A Petrobras vai recorrer e diz que tem esperança de conseguir inverter o resultado. Continua confiando na vitória apesar de o presidente do TST, ministro Brito Pereira, ter lembrado que o tribunal é a última instância em questões trabalhistas e avisado que a sentença terá que ser cumprida tão logo o acórdão seja publicado. Resta à Petrobras recorrer ao próprio TST, mas que argumentos levariam os ministros a mudar o entendimento? A empresa poderá recorrer ao STF, se houver uma questão constitucional envolvida.
Essa quantia despenca sobre a companhia quando ela se esforçava para reduzir os custos e resolver conflitos e passivos que haviam ficado das gestões anteriores do governo do PT. A empresa foi atingida pela corrupção que provocou entre outros problemas ações no exterior contra a companhia e que já custou um enorme volume de recursos para serem resolvidos. Teve também que suportar o ônus de investimentos decididos por razões políticas e que foram abandonados por serem inviáveis. Tudo teve que ser lançado a prejuízo. Aguentou por anos o custo do subsídio aos preços dos combustíveis. E agora, se for confirmada a derrota nessa ação bilionária, terá que pagar o preço de um acordo mal feito, mal redigido e mal executado. São muitos os esqueletos que ficaram da gestão petista na estatal e eles ainda não foram todos equacionados.
Os erros cometidos na administração do governo passado custaram no mínimo US$ 80 bilhões. Metade disso foi o custo de ser obrigada a vender combustível com preço controlado muito abaixo da paridade internacional. No Comperj, foram investidos US$ 13 bilhões sem retorno. O custo de Abreu e Lima que não será recuperado é calculado em US$ 10 bilhões. As duas refinarias premium que foram lançadas a prejuízo representaram US$ 1,5 bi. Tem ainda o que foi lançado como perdas por corrupção de R$ 6,2 bilhões. A compra de Pasadena representou uma perda de US$ 800 milhões a US$ 1 bilhão. Na compra da refinaria Okinawa no Japão foram queimados outros US$ 400 milhões. Esses são apenas alguns dos esqueletos deixados na companhia. Bilhões em passivos tributários têm sido equacionados. Essa ação trabalhista é mais um desses esqueletos.
Apesar de a Petrobras não precisar desembolsar os recursos imediatamente, a avaliação de especialistas é de que isso cria uma insegurança jurídica para novas ações trabalhistas contra a companhia. No entanto, a empresa permanecia ontem confiante de que conseguirá provar que cumpriu exatamente o que foi negociado na ação coletiva.
Miriam Leitão é jornalista